terça-feira, 29 de dezembro de 2009

A ATIVIDADE DE LECTINA DO COMPLEXO FATOR VIII DA COAGULAÇÃO/von WILLEBRAND

Francisca Santizo, Edgar Zenteno, Socorro Pina-Canseco, Pedro Hernandez-Cruz, Margarito Martínez Cruz, Laura Perez-Campos Mayoral, Eduardo Pérez-Campos e Ruth Martínez Cruz – México

RESUMO

O fator VIII da coagulação (FVIII) é essencial na rota intrínseca da coagulação e circula principalmente como um complexo ligado não covalentemente com o fator vonWillebrand (vWF). Esse complexo (FVIII/vWF) protege o FVIII da degradação e captura celular, embora nenhum papel biológico tenha sido observado para este complexo. O complexo FVIII/vWF foi purificado do plasma de doadores saudáveis por afinidade cromatográfica em coluna de sefarose de 4B-concanavalina A e foi usado para determinar sua capacidade de interagir com eritrócitos e plaquetas. O complexo FVIII/VWF purificado a 6,0 12 μg/ml aglutinou os eritrócitos de coelho e bovinos, e mostrou aglutinação negativa com eritrócitos de outras espécies incluindo os humanos ABO. O tratamento dos eritrócitos com sialidase de Clostridium perfringens ou tripsina aumentou em quatro vezes a atividade com respeito aos eritrócitos de coelhos e a aglutinação positiva para os eritrócitos humanos A e B, sugerindo a presença de receptores enigmáticos para FVIII/VWF nesses eritrócitos. Os eritrócitos de cabra, porco ou humanos tipo O não foram aglutinados ainda após o tratamento enzimático. A fucose ou a N-acetil-glucosamina (GlcNAc), a 10mM, inibiram a atividade de aglutinação do complexo com os eritrócitos do coelho, e humanos de tipo A e B, enquanto a galactose e a N-acetil-galactosamina, ainda que a 200 mM, não mostraram nenhum efeito na atividade do complexo. O complexo FVIII/VWF, a 1,5 µg/200.000 plaquetas, diminuiu significativamente a agregação das plaquetas (p<0,001) color="#003333">Obs.1: Omim 603609 –A L-fucose é um açúcar chave nas glicoproteínas e outros complexos de carboidratos pois ela pode ser envolvida em muitos dos papéis funcionais dessas macromoléculas, tais como reconhecimento célula-célula. O doador de fucosil para esses oligossacarídeos fucosilados é a GDP-beta-L-fucose. A maior via para biossíntese da GDP-fucose converte a GDP-alfa-D-manose em GDP-beta-L-fucose. Veja omim 602884. Uma via alternativa está presente em alguns tecidos de mamíferos como fígado e rins, e parece funcionar como uma via de recuperação para reutilizar a L-fucose que chega da reviravolta de licoproteínas e glicolipídeos. Essa via envolve a fosforilação da L-fucose para formar beta-L-fucose-1-fosfato, e então a condensação da beta-L-fucose-1-fosfato com GTP por uma GDP-L-fucose pirofosforilase (GFPP) para formar GDP-beta-L-fucose.]

[Obs.2: GlcNAc - Outros nomes: 2-acetamido-2-desoxiglucose, Acetilglucosamina, Glucosamina, Glucosamina-6-fosfato, Glucosamina N-Acetil, N-Acetil D-Glucosamina, NAG, N-A-G, Poli-NAG.
A GlcNAc é um monossacarídeos derivativo da glucose. Ele é um amido entre glucosamina e ácido acético. Ele é parte de um bio-polímero na parede celular da bactéria, construído a partir de unidades alternantes de GlcNAc e ácido N-acetilmurâmico (MurNAc), ligado em cruzamento com oligopeptídeos no resíduo de ácido láctico do MurNAc. Sua estrutura é chamada peptidoglicano. A GlcNAc é a unidade monomérica da quitina, a qual forma a cobertura externa de insetos e crustáceos.
http://en.wikipedia.org/wiki/N-Acetylglucosamine]

INTRODUÇÃO

O Fator VIII da coagulação humana (FVIII) é um co-fator essencial para a ativação proteolítica do Fator X. O FVIII é ativado pela trombina e pelo Fator Xa da coagulação; o Fator IXa (FIXa) ativa o Fator X (FXa), requerendo Ca2+, fosfolipídeos, e Fator VIII ativado (FVIIIa) (Schmidt e outros 2005). O FVIII e o fator von Willebrand (vWF) formam um complexo não covalentemente ligado. Esse complexo circula no plasma humano, é fundamental para a homeostase, e normalmente existe em forma inativa. A ligação do FVIII ao vWF é essencial para a sobrevivência do FVIII ‘in vivo’ (Kaufman e Pipe, 1999). Deficiências ou defeitos estruturais no FVIII são responsáveis pelas mais comuns das desordens que causam sangramento, tais como a hemofilia e a doença de von Willebrand (Lilicrap 2008).

O FVIII é um polipeptídeo de 2332 aminoácidos, sintetizado no fígado pelas células parenquimais e células endoteliais do seio hepático (células dos vasos sanuíneos do fígado?), bem como pelo endotélio pulmonar. O FVIII tem vários sítios de glicosilação que parecem importantes na cinética de sua circulação. Esse fator possui glicanas (polissacarídeo) ligadas por glicose em sua ponta N (nitrogênio), que são caracterizadas por um cerne interno de asparagina com N-acetil-glucosamina (GlcNAc) [asparagina com glucosamina ligada no nitrogênio) e são relevantes para o dobramento e secreção produtiva do FVIII, e glicanas glicosidicamente ligadas em O (oxigênio), que são caracterizadas por N-acetil-galactosamina de serina/treonina e estão envolvidas na determinação da conformação e interação da proteína com outras glicoproteínas. O FVIII possui dois sítios manosilados incomuns que podem ser reconhecidos por receptores de manose nas células Kupffer (Dasgupta e outros 2007). [Obs.: N-acetilglucosamina ligada em O é uma abundante modificação pós-tradução de resíduos serina ou treonina de proteínas nucleares e citoplasmáticas. PMID 9550544]

[Obs.: A glicosilação é o processo enzimático que liga sacarídeos para produzir glicanas, presas a proteínas, lipídios, ou outras moléculas orgânicas. Esse processo enzimático produz um dos biopolímeros fundamentais encontrados em células (ao longo do DNA, RNA e proteínas). A glicosilação é a forma de modificação durante e depois da tradução. As glicanas servem a uma variedade de papéis estruturais e funcionais na membrana e em proteínas secretadas. A maioria das proteínas sintetizadas no retículo endoplasmático rugoso submetem-se à glicosilação. Este é um processo de sítio específico direcionado por enzima, em oposição à reação química de glicação não enzimática. A glicosilação também está presente no citoplasma e no núcleo como modificação por O-GlcNAc. Cinco classes de glicanas são produzidas: glicanas ligadas ao N (nitrogênio) presas em um nitrogênio da cadeia lateral da asparagina ou arginina, glicanas ligadas em O (oxigênio) presas ao oxigênio hidroxi (da hidroxila?) da serina, treonina, tirosina, hidroxilisina ou hidroxiprolina das cadeias laterais, ou a oxigênios em lipídios tais como a ceramida; fosfo-glicanas ligadas através do fosfato de uma fosfo-serina; glicanas ligadas a C (carbono), uma forma rara de glicosilação onde um açúcar é adicionado a um carbono em uma cadeia lateral do triptofano, e a glipiação que é a adição de uma âncora GPI (glicosilfosfatidilinositol) que liga proteínas a lipídeos através de elos de glicanas.
A O-GlcNAc é adicionada a serinas ou treoninas pela O-GlcNAc transferase. A O-GlcNAc parece ocorrer na maioria das serinas e treoninas que poderiam ser de outro modo fosforiladas por cinases serina/treonina. Assim, se a fosforilação ocorre, a O-GlcNAc não ocorre e vice-versa. Esse é um inacreditável achado pois a fosforilação/desfosforilação tem-se tornado um paradigma científico para a regulação da sinalização dentro das células. Uma quantidade massiva de pesquisas em câncer está focalizada na fosforilação. A ignorância do envolvimento dessa forma de glicosilação, a qual claramente parece agir em harmonia com a fosforilação, importa em que muitas pesquisas correntes perdem ao menos metade da paisagem. A adição e remoção da O-GlcNAc também parece ser uma chave na regulação das vias que são rompidas no diabetes mellitus. O gene codificador da enzima O-GlaNAcase tem sido ligado ao diabetes mellitus não dependente de insulina. Ela é a etapa terminal em uma via de sinalização de hexosaminas (amina derivada de hexose, um açúcar com seis carbonos) sensíveis a nutrientes
http://en.wikipedia.org/wiki/Glycosylated]

O FVIII se liga às plaquetas de modo saturável e específico. (Nescheim e outros 1988; Ahmad e outros.2000). O VWF é sintetizado através de um processo de múltiplas etapas em megacariócitos e células endoteliais, ele é estocado nos grânulos alfa das plaquetas, no corpo de Weibel-Paladedas células endoteliais, e está presente no plasma e no sub-endotélio vascular. [Obs.: Corpos de Weibel-Palade são organelas encontradas em células endoteliais, uma única camada de células que se alinham nos vasos sanguíneos e no coração. Eles atuam num duplo papel na hemostasia da coagulação sanguínea e na inflamação. A outra molécula estocada nos corpos de Weibel-Palade é a selectina P (das plaquetas) que atua num papel central na capacidade das células endoteliais inflamadas recrutares leucócitos em trânsito, permitindo a eles saírem do vaso sanguíneo e entrarem no tecido circunscrito, onde eles podem migrar para o sítio de infecção ou lesão. Outros componentes do corpo de Weibel-Palade são quimiocinas como interleucina 8 e eotaxina-3, endotelina-1, angiopoietina-1, osteoprotegerina e tetraspanina CD63/lam3 e alfa-1,3-fuscosiltransferase VI. http://en.wikipedia.org/wiki/Weibel-Palade_body] Essa grande proteína com uma única estrutura multimérica atua num papel central em ambas a hemostasia (coagulação) do sangue e na trombose intravascular patológica pois ela media a adesão da plaqueta à parede injuriada do vaso, e ela carrega e protege o Fator VIII. A VWF, a qual é composta de idênticas sub-unidades de 250 quilo-dáltons ligadas por dissulfeto (pontes?) media a coagulação através de suas múltiplas funções adesivas para receptores de membrana de plaquetas, complexo de glicoproteínas Ib-IX-V, integrina alfa-IIb-beta 3, heparina, vários tipos de colágeno, selectinaP (CD62P), e FVIII, e é expressada exclusivamente em plaquetas ativadas (Denis 2002; Sugimoto e Miyata 2002).

Sugeriu-se que o complexo FVIII/VWF possui atividade de lectina, já que o complexo interage com amino-açúcares, tais como galactosamina e manosamina, e alguns aminoácidos como arginina (Booth e outros, 1984; Lillicrap, 2008). Entretanto, um papel biológico para o complexo FVIII/VWF não foi determinado até o presente. Uma lectina é uma proteína de ligação a açúcar de origem não imune que aglutina células ou precipita glico-conjugados (Goldstein e outros.1980). As lectinas podem ser solúveis ou ligadas a membranas e ocorrem em muitos tipos de organismos (Debray e outros, 1981; Sharon e Lis, 2004). Neste estudo, nós analisamos a atividade da lectina e a especificidade do açúcar do complexo FVIII/VWF por ensaios de determinação de atividade de hemaglutinação, seus efeitos na agregação plaquetária e sua especificidade para carboidrato com carboidratos derivados de dextran.

Continua.

Fonte: http://www.jstage.jst.go.jp/article/tjem/217/3/217_209/_article
PMID: 19282656

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