segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

CONT.
O ENVOLVIMENTO DE FcyRI (CD64) NO MECANISMO DE INIBIÇÃO DO HIV-1 EM MACRÓFAGOS DERIVADOS DE MONÓCITOS PELA IgG POLICLONAL PURIFICADA DE PACIENTES INFECTADOS .


Discussão:


Estes experimentos foram designados para analisar os mecanismos de inibição da replicação do HIV pela IgG humana monoclonal ou policlonal nos MDMs 24 horas após a infecção. Neste propósito, nós compomos/geramos um ensaio de único ciclo de infecção usando tanto o MDM quanto a PBMC como alvo do HIV. Nós encontramos a neutralização de isolados primários do HIV-1 por amostras de IgG monoclonal e IgG policlonal purificadas de indivíduos infectados com o HIV-1 consideravelmente mais alta quando os MDMs, no lugar das PBMCs, foram usados. Além disso, amostras de IgG purificadas, as quais não exibiam potente atividade neutralizante em PBMCs infectadas pelo HIV, exibiram potente atividade neutralizante em MDMs. Zhuge e outros e Ruppach e outros noticiaram previamente resultados mostrando neutralização mais alta de SIV ou HIV quando os MDMs foram usados como células alvo ao invés de PBMCs em ensaios de neutralização de múltiplas rodadas. Ruppach e outros analisaram neutralizações autólogas de vírus isolados logo após a infecção por seus soros correspondentes e o procedimento experimental para neutralização usando ambos PBMC ou MDM não foi estritamente idêntico. Como nós encontramos um aumento comparável na neutralização da infecção em macrófagos usando a IgG policlonal de indivíduos infectados por longo período, nós demonstramos que esse aumento da atividade neutralizante não está restrito às IgGs autólogas iniciais. Além disso, nós usamos um ensaio de único ciclo de neutralização com condições de experimentação idênticas para ambos a PBMC e o MDM. Considerando uma única rodada de infecção, um aumento eventual da neutralização devido à baixa produção de vírus nos macrófagos humanos primários está minimizada. De fato, nós efetivamente observamos um título de neutralização mais alto das amostras de IgG nos ensaios de replicação do HIV em múltiplas rodadas comparados com os ensaios de neutralização de um único ciclo, quando os MDMs foram usados como células alvo.

A atividade inibidora mais alta não é somente devida a implicações de uma sub-população de anticorpos presente na amostra de IgG policlonal direcionada a epítopos especificamente envolvidos na inibição da replicação do HIV nos MDMs como os mAbs IgG1b12, 4E10 e 2F5 que também neutralizaram mais eficientemente os isolados primários do HIV nestas células. Estes mAbs têm sido descritos por exibirem ampla atividade de neutralização cruzada contra um amplo raio de ação de isolados primários do HIV-1 em ensaios “in vitro” envolvendo as PBMCs como células alvo. Stamatatos e outros já descreveram um aumento similar a 10 vezes na inibição da infecção em MDMs por mAb IgG1b12. Este último grupo propôs que este título de neutralização medido mais alto deve resultar da expressão mais baixa de sítios alvo CD4 nos MDM. De fato, os MDM expressam menos moléculas CD4 do que as PBMCs e assim, menos IgG1b12 devem ser necessárias para bloquear a interação dos vírions com os receptores CD4 presentes nestas células. Entretanto, nós encontramos que o bloqueio da interação do vírus com a CD4 por CD4 solúvel foi tão eficiente quanto foram usadas PBMCs ou MDMs, sugerindo que a aumentada atividade neutralizante nos MDMs não é simplesmente a conseqüência da expressão mais baixa de CD4 nessas células humanas primárias. Nós observamos um aumento mais alto na atividade de neutralização (maior que 300 vezes) para ambos os mABs 2F5 e 4E10 do que para IgG1b12; isso pode sugerir que o epítopo conservado em gp41 é mais relevante do que o epítopo do sítio de ligação de CD4 para a neutralização da infecção em MDMs ou que a atividade pode ser modulada por diferenças em suas estruturas. Como o epítopo em gp41 não é muito acessível na partícula viral nativa, nós podemos enfatizar suplementarmente que a ligação do Abs às partículas virais não está correlacionada com a neutralização na infecção do macrófago. Tal discordância entre a ligação e a neutralização foi previamente noticiada para outros mAbs por Stamatatos e outros. As amostras de IgG policlonal purificadas de pacientes infectados por HIV usadas neste estudo foram todas capazes de capturar eficientemente os dois isolados do HIV primários usados para a determinação do título de neutrallização. Entretanto, a eficiência das amostras de IgG purificadas na captura do vírus não foi correlacionada aos títulos de neutralização obtidos quando tanto PBMCs ou MDMs foram usadas como células alvo.

Como a IgA tem sido apresentada por exibir atividade neutralizante do HIV, nós avaliamos a capacidade de algumas IgA purificadas do soro de pacientes infectados por HIV neutralizarem isolados primários quando as células alvo usadas foram as PBMC e as MDM. Contrariamente à IgG, nós não observamos uma neutralização aumentada do HIV em MDM por IgA policlonal, indicando que esse aumento do título de neutralização observado em MDM é específico para IgG.

Contrariando notícias prévias, quando ao MDMs foram usados como células alvo, a atividade neutralizante de Fab ou F(ab’)2 das IgG policlonais foi reduzida à atividade inibitória detectada quando as PBMCs são as células alvo do HIV em ensaios de neutralização.

As duas primeiras reportagens analisando a neutralização da infecção de macrófagos encontraram que o Fab tem uma atividade inibitória similar a seu correspondente IgG total (o anticorpo todo). Tais discrepâncias entre esses resultados prévios e nossos achados não puderam ser atribuídos à degradação, diluição ou perda de material resultante de tratamento enzimático de novas preparações de Fab ou F(ab’)2 pois esses fragmentos conservaram sua potência de neutralização quando as PBMCs foram usadas como células alvo do HIV. A discrepância também não pode estar relacionada ao tipo de ensaio usado, pois nós também detectamos uma grande diferença na atividade inibitória entre a IgG total e o Fab ou F(ab’)2 em ensaios de múltiplas rodadas, similar ao ensaio usado por Zhuge e outros ou Ruppach e outros (dados não mostrados). A diferença pode estar relacionada às amostras policlonais usadas. Ruppach e outros têm avaliado a capacidade neutralizante do soro e uma amostra de IgG purificada de indivíduos recentemente infectados (poucos meses após a soroconversão); Zhuge e outros usaram soro e duas amostras de IgG purificada obtidas de macacos, 6 meses após a inoculação com SIV enquanto nossas amostras de IgG foram obtidas de indivíduos assintomáticos coletadas após uma infecção com duração média de sete anos. É notável que Ruppach e outros tenham regulado as quantidades de IgG correspondendo a 10% estimadas no soro dos pacientes por SDS-PAGE. Nas nossas condições experimentais de neutralização, nossos Fab ou F(ab’)2 também são capazes de inibir completamente a replicação do HIV nos MDMs quando usados em altas concentrações (correspondendo a 10% das IgG no soro). Entretanto as nossas IgG policlonais tem atividade inibitória para o HIV mais de 100 vezes mais alta do que o Fab ou F(ab’)2, pois aproximadamente 2µg/ml de IgG purificada é o suficiente para reduzir perto de 90% o número de células MDMs infectadas. Todavia, essa observação não se aplica para os resultados publicados por Zhuge e outros que acharam a concentração de 1μg/ml de Fab tendo atividade inibitória similar à IgG completa do soro de macacos infectados com SIV.

Experimentos de competição efetivados entre fragmentos Fc de IgG de doadores não infectados com HIV e amostras de IgG policlonal de indivíduos infectados com HIV validaram ainda mais a participação dos domínios Fc de IgG na forte inibição observada quando as MDM são usadas como células alvo do HIV. Além disso, nós demonstramos que essa inibição do HV-1 nos MDM por IgG policlonal e monoclonal envolvem principalmente a participação do FcyRI (ou CD64). O FcyRI é largamente expressado (> 90%) na superfície celular dos macrófagos e têm alta afinidade para IgG. Esses FcyRs estão implicados na degradação do vírus por fagocitose ou na lise de macrófagos infectados por citotoxidade celular dependente de anticorpos (ADCC). Ambos os mecanismos TAM sido largamente descritos por representarem a destruição dos vírus nessas células. Macrófagos e outras células fagocíticas (neutrófilos, monócitos e células dendríticas) estão no encargo da rápida degradação do vírus, as quais uma vez opsonizadas por IgG podem ligar-se em cruzamento com os FcyRs na superfície celular de outra célula efetora e sofrerem fagocitose. Para ADCC, o anticorpo fixado por via de FcyRs na superfície dos MDM reconhece uma célula infectada, a qual expressa o Ag (antígeno) viral em suas membranas de superfície, e media a lise dessa última célula. Além disso, a citotoxidade dependente de complemento ativada através da ligação de C1q ao domínio Fc de IgG ou IgM, complexado com Ags , também explica a lise de células infectadas.

Como nossas IgGs purificadas não contém complemento, nós podemos excluir a citotoxidade dependente do complemento como um possível mecanismo de inibição. O fato de que nós temos sido incapazes de detectar um aumento no número de células submetendo-se à apoptose ou necrose na presença de concentrações de Abs inibitórios após um único ciclo de replicação do HIV (dados não mostrados) não está a favor do mecanismo de ADCC, mas é difícil quantificar um baixo nível de citotoxidade dada a porcentagem muito baixa de células infectadas com o HIV. Além disso, a adição de IgG, três horas após a adição dos vírus nas células, não protege os MDM da infecção por HIV-1 (dados não mostrados) contestando o mecanismo de ADCC nas condições de nossa cultura experimental. Assim, nós propusemos dois mecanismos de inibição do HIV-1 nos MDM: o primeiro consistindo na neutralização de inectividade por anticorpos que reconhecem epítopos específicos do HIV (um mecanismo que é comum para PBMC e MDM e ocorre em amplitudes de concentração similares) e o segundo baseado na inibição do HIV por via do FcyRI envolvido na fagocitose dos complexos IgG-vírus por macrófagos (captura de complexos imunes por FcyRI, internalização por via de vesículas endossômicas, e degradação suplementar do vírus).

Dependendo de seus sub-tipos, a IgG liga-se a FcyR com eficiência variada, assim, diferenças em sua região Fc de IgG podem influenciar na inibição do HIV por endocitose. Entretanto, para os dois anticorpos monoclonais usados, 2F5 e IgG1b12, as regiões Fc eram similares (IgG1ĸ) sugerindo que a diferença na inibição do HIV observada com esses dois anticorpos monoclonais não é devida ao subtipo de IgG.

Os FcyRs também têm sido implicados no aumento da infecção dependente de anticorpos. Trichmann e outros puderam detectar um aumento da produção do vírus em macrófagos primários humanos quando imunocomplexos de HIV formados com certos Abs ligaram-se ao receptor CD16 ou ao FcyRIII. Em nosso estudo, nós não observamos nenhum aumento de infecção de MDM com os anticorpos policlonais e monoclonais testados usando o ensaio de infecção de rodada de ciclo.

Recentemente, Perez-Bercoff e outros propuseram que a estimulação de FcyR pela IgG humana de doadores não infectados com HIV poderia mediar a inibição da replicação do HIV em macrófagos “in vitro” quando revestidas numa placa. Esses autores especularam que a ativação do macrófago através da ligação cruzada a FcyR, sozinha ou em sinergia com outro estímulo tais como lipopolissacarídeos ou citocinas, poderia contribuir para a proteção natural contra a infecção por HIV-1 em alguns indivíduos expostos não infectados por inibição da transmissão viral. Nossos achados estão de acordo com o papel central dos FcyRs presentes na membrana celular dos macrófagos, os quais podem contribuir para a remoção de imunocomplexos HIV-IgG “in vitro”. Em contraste, a ligação cruzada de FcyR em monócitos humanos e MDMs tem sido noticiada por induzir um painel de quimiocinas e citocinas, notavelmente GM-CSF. Quimiocinas, tais como MIP-1α, MIP-1β e RANTES tem sido mostradas por inibir a replicação quando adicionadas durante e após a infecção e poderiam assim contribuir para a supressão da replicação do HIV-1 detectado em nosso ensaio. Por isso nós quantificamos os níveis dessas quimiocinas nos supernadantes de MDMs infectados em paralelo com os experimentos de competição de anticorpos. As quantidades de MIP-1 alfa, MIP-1beta e RANTES detectados nos sobrenadantes de MDM, 2 e 6 horas após a infecção, estavam abaixo da concentração inibitória requerida para inibir a replicação do HIV nestas células e não estavam correlacionadas com a inibição viral observada após uma única rodada de replicação viral. De nota, a secreção de quimiocina registrada 24 horas após a infecção foi da mesma ordem de magnitude daquela medida às 6 horas (nossos resultados não publicados).

Macrófagos representam uma população de leucócitos envolvida na primeira linha de defesa contra muitas infecções, incluindo a infecção por HIV. Através da apresentação de antígenos para células T e da produção de citocinas e quimiocinas, os macrófagos constituem uma ligação importante entre os sistemas imunes adaptativo e inato. Múltiplos estudos incluindo os nossos dados têm sugerido o papel potencial dos macrófagos na inibição do HIV, tanto por fagocitose de imuno-complexos, por mediação de ADCC, ou mesmo através da produção de quimiocinas. Entretanto, embora os anticorpos altamente eficientes em inibir a infecção dos MDMs “in vitro” fossem encontrados no soro de quase todos os indivíduos infectados, o HIV dissemina-se e persiste nestes indivíduos.

A carência de remoção de imunocomplexos HIV-IgG pode ser atribuída à diminuída fagocitose específica por FcyR como descrito em alguns pacientes com AIDS. De fato, após a infecção “in vitro” com HIV-1 BaL, a fagocitose de imuno-complexos mediada tanto por FcyR e receptores de complemento está diminuída nos MDMs humanos infectados. Estes autores têm mostrado que a infecção dos macrófagos por HIV não afeta a expressão de superfície nem de FcyR nem do principal receptor de complemento, mas nos macrófagos infectados com HIV a transdução de sinal é diminuída e a remoção de alvos opsonizados por IgG por via de FcyR está alterada. Assim a IgG humana presente na maioria dos indivíduos infectados por HIV são capazes de ligar-se a partículas do HIV e formar complexos imunes, mas a fagocitose está diminuída nos macrófagos infectados.

Não somente os complexos IgG-vírus puderam ser ineficientes para inibir a replicação do HIV “in vivo”, a ligação de IgG ao vírus pode mesmo favorecer sua persistência quando apanhados por células dendríticas foliculares. De fato, um estudo recente tem mostrado que a manutenção da ótima infectividade do HIV requer tanto anticorpos contra determinantes associados a partículas quanto contra FDC-FcyR. Em adição à fagocitose diminuída e à captura do vírus pelas células dendríticas, o escape imune, a infecção dependente de anticorpo e mediada pelo complemento nos MDM podem contribuir para a falência de anticorpos neutralizantes no controle do HIV.

Todavia, antes da infecção ser estabelecida e células dendríticas foliculares estarem ricas em HIV e numerosos macrófagos infectados, alguém pode esperar que tais anticorpos, os quais eficientemente inibiram o HIV quando os MDMs foram usados como células alvo, poderiam participar na redução da carga viral no plasma na fase inicial assintomática.

A transmissão passiva de HIVIG (IgG policlonal derivada do plasma de múltiplos HIV de doadores positivos) exclusivamente em macacos, 24 horas antes do desafio com o vírus SHIV89.6PD, reduziu o declínio da contagem de células TCD4+ e preveniu a AIDS clínica durante 14 semanas de observação. Neste trabalho, um declínio na carga viral do plasma foi observado a despeito do HIVIG não estar sendo muito eficiente na neutralização da infecção em PBMC. Como nós não sabemos se o HIVIG é capaz de inibir SHIV89.6PD quando os MDM são usados como células alvo, nós não podemos concluir se este declínio (quando usaram-se as PBMC) poderia ser atribuído à remoção do vírus por macrófagos. Em outro estudo de transferência passiva, Binley e outros infundiram anticorpos coletados de macacos infectados com SIVmac251 em outros macacos infectados que tinham uma resposta negligente de anticorpos. Esses anticorpos não foram capazes de neutralizar a infecção nas PBMC mas certamente formaram complexos imunes pois eles ligaram-se às partículas virais. A transferência de tais anticorpos resultou em decréscimo de 3 vezes na carga de RNA no plasma concomitante a um similar surgimento de surpresa de RNA viral associado a células dentro de 2 horas após a infusão. A inibição é entretanto somente transitória. Esses autores concluíram a partir da cinética da inibição que o decréscimo do vírus observado está inconsistente com a neutralização de novos ciclos de infecção ou com o mecanismo de remoção dos imuno-complexos e que a melhor explicação aceitável é que os anticorpos infundidos mataram células infectadas por SIV por via de um mecanismo efetor como ADCC.

Estudos adicionais poderiam ser desempenhados para esclarecer as implicações clínicas dos Abs capazes de inibir a replicação do HIV in vitro quando os macrófagos são células alvo, como, por exemplo, as análises de neutralização de vírus autólogos isolados pelas correspondentes amostras de IgG nos sujeitos apropriados (i.e. não progressores de longo tempo versus rápidos progressores). Se tais anticorpos atuam num papel “in vivo” na proteção contra a infecção, eles também devem ser um dos componentes a serem induzidos por vacinação, e presentes no sítio de infecção para permitir a primeira e eficiente remoção do HIV-1 por macrófagos. Como tais Abs são detectados em níveis muito mais altos após a infecção do que Abs neutralizando a infecção nas PBMC, alguém pode especular que sua indução por vacinação também deveria ser alcançada mais facilmente.

Fonte: http://www.jimmunol.org/cgi/content/full/173/10/6274

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