domingo, 26 de outubro de 2008

INTERAÇÃO DA PROTEÍNA Tat DO HIV-1 COM HEPARINA – Modelo da estrutura, sulfatização e tamanho.

[do artigo:
Interaction of HIV-1 Tat Protein with Heparin
ROLE OF THE BACKBONE STRUCTURE, SULFATION, AND SIZE*
(Received for publication, November 14, 1996, and in revised form, January 16, 1997)
Marco Rusnati, Daniela Coltrini, Pasqua Oreste‡, Giorgio Zoppetti‡, Adriana Albini§,
Douglas Noonan§, Fabrizio d’Adda di Fagagna¶, Mauro Giacca¶, and Marco Prestai


THE JOURNAL OF BIOLOGICAL CHEMISTRY Vol. 272, No. 17, Issue of April 25, pp. 11313–11320, 1997
© 1997 by The American Society for Biochemistry and Molecular Biology, Inc.]


INTRODUÇÃO

A proteína Tat do vírus da imunodeficiência humana (HIV-1) é liberada das células infectadas. A Tat extra-celular entra na célula onde estimula a atividade transcricional do longo terminal de repetição do HIV (LTR) e de genes endógenos. A heparina modula a atividade angiogênica e transcricional da Tat extra-celular. Aqui nós demonstramos que a heparina liga-se especificamente à Tat recombinante do HIV-1 produzida como fusão da proteína glutationa S-transferase (GST) [glutationa é um tripeptídeo da glicina, da L-cisteína e do L-glutamato com o L-glutamato que possui uma ligação isopeptídica com o radical amino da L-cisteína; a glutationa tem numerosas funções na célula; é o tiol não-proteico mais prevalente... a deficiência de glutationa pode causar hemólise (liberação de hemoglobinas dos eritrócitos) com estresse oxidativo; no metabolismo intermediário, é doadora de grupamentos tiol (SH); glutationa S-transferase é uma classe de enzimas que catalisam a reação da glutationa com uma molécula aceptora (p.ex. um óxido de hidrocarboneto que contém pelo menos um anel aromático), para formar uma glutationa S-substituída; uma etapa fundamental na detoxificação de muitas substâncias; sin. ligandin] e imobilizada em gotas de agarose-glutationa. A heparina e o sulfato de heparan (HS), mas não o sulfato de dermatan , sulfatos de condroitina A e C [sulfato de condroitina é um(muco) polissacarídeo(proteoglicana) composto de resíduos alternados de ácidoβ-D-glucurônico e sulfato de N-acetil-galactosamina em ligações β(1-3) e β(1-4) alternadas; presente entre os constituintes da substância fundamental da matriz extracelular de tecido conjuntivo; o sulfato de condroitina A é uma condroitina com resíduos sulfúricos encontrada nos tecidos conjuntivos e a condroitina C também tem estes resíduos, mas em outra posição; a condroitina B é o sulfato de dermatan], ácido hialurônico [mucopolissacarídeo constituído por resíduos de ligação beta 1,4 alternados de ácido hialurônico, formando um material gelatinoso nos espaços teciduais e atuando como lubrificante e absorvente de choque geralmente por todo corpo; é hidrolisado à unidadededissacarídeos ou tetrassacarídeos pela hialuronidase] e o polissacarídeo K5 (queratina 5, lócus 12p13) competiram com heparina marcada com H (heparina marcada com substância facilmente detectável) pelas ligações a Tat-GST imobilizada e inibiram a transativação do LTR do HIV-1 induzida pela Tat-GST extracelular.


A dessulfatização seletiva em 2-O- e 6-O-, ou a dessulfatização total –O-, ou a dessulfatização em N/acetilação em N reduziram dramaticamente a capacidade da heparina ligar-se à Tat-GST. Heparinas totalmente dessulfatizadas –O- e dessulfatizadas 2-O- também apresentaram uma reduzida capacidade de inibir a atividade trans-ativadora de Tat. Heparinas de peso molecular muito baixo apresentaram um decréscimo significativo em sua capacidade de ligarem-se a Tat-GST e de inibirem sua atividade trans-ativadora do LTR quando comparadas com a heparina convencional de 13,6 quilo-dáltons. Entretanto, quando a heparina de 3,0 quilo-dáltons foi cromatografada [cromatografia é a separação de substâncias químicas e partículas por movimento diferencial através de um sistema de duas fases; a mistura de materiais a serem preparados é percolada através de uma coluna ou folha de algum absorvente adequadamente escolhido (p.ex. um material de intercâmbio iônico); as substâncias menos absorvidas emergem mais tarde.] em afinidade à Tat-GST imobilizada para isolar as sub-frações ligadas e não-ligadas, a fração ligada à Tat era 1000 vezes mais potente em inibir a atividade trans-ativadora de Tat-GST do que a fração não ligada.

Os resultados demonstram que Tat interage de maneira dependente do tamanho da Heparina/HS(heparan sulfato ou sulfato de heparan) e que a alta afinidade da interação Tat‑heparina requer ao menos as posições 2-O-, 6-O- e N para ser sulfatada. A atividade de ligação de Tat aos glicosaminoglicanos testados correlaciona-se com sua capacidade de afetar a atividade trans-ativadora da Tat extra-celular, indicando a possibilidade de desenharem-se estruturas específicas similares a heparina/HS com a atividade antagonista a Tat.

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Tat é um gene regulatório viral do vírus da imunodeficiência humana de tipo 1 (HIV-1), o agente etiológico da AIDS. A Tat é essencial para a replicação viral pois seu produto protéico promove a transcrição do genoma viral por interação com o elemento responsável pela trans‑ativação, localizado na extremidade 5’ dos mRNAs virais. A proteína Tat do HIV-1 é um polipeptídeo de 86 a 102 aminoácidos, dependendo da fita viral (alterna de um vírus para o outro, porque o domínio B é muito variável), a qual é codificada por dois éxons e traduzida a partir de mRNAs multiplamente processados por splicing em faixas de duas (2) quilo-bases. A seqüência de aminoácidos 1-72 (do primeiro ao heptagésimo segundo) é codificada pelo primeiro éxon do gene Tat e é dotada de abundante atividade trans-ativadora, enquanto a região terminal em carboxila (COOH-), codificada pelo segundo éxon (do aminoácido 73 ao 86), não é requerida para a atividade trans-ativadora de Tat nem para a replicação do HIV-1.

A Tat é liberada de células infectadas por HIV-1. A Tat extracelular tem a habilidade de entrar na célula e no núcleo em forma ativa onde pode estimular a atividade transcricional do LTR do HIV. A Tat exógena absorvida por células não infectadas também pode trans-ativar genes endógenos, induzindo a produção de várias citocinas e seus receptores. Tem sido recentemente demonstrado que a trans-ativação do LTR e possivelmente a transcrição de genes celulares dependem da ativação de NF-kB (Fator Nuclear Kappa B; OMIM 164011) por Tat. A Tat exógena também é capaz de exercer atividade angiogênica “in vitro” e “in vivo” e estimular a proliferação celular, a quimio-invasão e ativação de células endoteliais cultivadas.

Os mecanismos de captura da Tat extra-celular, transporte intra-celular para o núcleo e atividade biológica exercida em células não infectadas ainda não estão claros. A Tat tem sido apresentada como ligante aos receptores de integrina, e aos receptores da quinase de tirosina (quinase que fosforila resíduos de tirosina) do fator de crescimento do endotélio vascular Flk‑1/KDR, de modo análogo ao fator de crescimento endotelial vascular por si mesmo Às células endoteliais. Também, a capacidade de Tat interagir com sulfato de heparina-heparan sulfato (HS) pode atuar num importante papel em sua interação com a superfície celular. A heparina inibe a captura da Tat extracelular e sua atividade trans-ativadora do LTR do HIV-1. A absorção de Tat é significativamente reduzida em células ovarianas mutantes de hamsters chineses defeituosas na síntese de glicosaminoglicanas (GAGs). Similar a vários fatores de crescimento angiogênicos ligantes a heparina, a atividade angiogênica exercida por Tat “in vivo” e sua atividade mitogênica e quimio-atrativa para células endoteliais cultivadas são moduladas por heparina. Finalmente, a proteína Tat recombinante do HIV-1 liga-se a suportes de Heparina-Sefarose (composto usado em testes do tipo blot. Obs.: a heparina é um anti-coagulante) e é purificada somente em altas concentrações de sal. Essas observações sugerem que os proteoglicanos HS (heparan sulfato proteoglicano)associados às células funcionam como co-receptores de superfície celular para a Tat exógena.

A heparina consiste largamente de unidades de dissacarídeo N-6-dissulfato D-glucosamina. Outros dissacarídeos contendo ácido L-iurônico ou D-glucurônico não sulfatados e N-sulfato ou N-acetilato de D-glucosamina também estão presentes enquanto componentes menores. Esta heterogeneidade é mais pronunciada em Heparan Sulfato, onde os dissacarídeos pouco sulfatados são mais abundantes. Observações recentes têm mostrado que a interação de heparina-HS com vários fatores de crescimento angiogênco, incluindo o fator básico de crescimento de fibroblastos (bFGF), fator de crescimento de hepatócitos, e fator de crescimento endotelial vascular, depende do peso molecular da cadeia de polissacarídeos e do grau de distribuição dos grupos sulfato. Interessantemente, distintas seqüências de oligossacarídeos têm sido identificadas por reterem a capacidade de ligação do fator de crescimento de hepatócito ou do fator de crescimento básico do fibroblasto (bFGF). Em adição, estudos de ligação envolvendo heparinas ou preparados HS modificados têm mostrado que os grupos sulfato 2-O- e N- são importantes para a interação de bFGF, enquanto o fator de crescimento do hepatócito interage principalmente com grupos sulfato 6-O-. Tomados juntos, estes dados sugerem que requisitos distintos na estrutura são necessários para a interação de heparina/HS com diferentes fatores de crescimento.

Aqui, nós temos investigado as bases moleculares das interações de Tat com heparina. Diferentes glicosaminoglicanas, heparinas seletivamente dessulfatizadas, e heparinas com diferentes pesos moleculares foram avaliadas por sua capacidade de interagir com a proteína Tat em sistemas celulares livres. Esses compostos também foram avaliados por sua capacidade de modular a atividade trans-ativadora do LTR da Tat extracelular. Os resultados indicam que, entre os GAGs (glicosaminoglicanas) testados, somente a heparina e o HS interagem com Tat e inibem sua atividade trasn-ativadora. A interação requer ao menos alguns grupos de sulfato 2-O-, 6-O- e N- e é significativamente afetada pelo tamanho da cadeia do polissacarídeo.

PROCEDIMENTOS EXPERIMENTAIS

MATERIAL: HS de tipo 1 é de Opocrin (Corlo, Itália). O polissacarídeo K5 foi preparado como descrito. Os sulfatos de condroitina (polissacarídeo proteoglicano) A e C, dulfato dermatano, e ácido hialurônico foram uma doação do Dr. M. Del Rosso, da Universidade de Florença, Itália.

A heparina convencional (13,6 quilo-dáltons) foi obtida de um preparado convencional conjunto de heparina sódio (sal de heparina?) da mucosa da carne de vaca(1131/900 do Laboratório Derivati Organici S.p.A, Milão, Itália) a qual foi purificada de contaminantes de acordo com as metodologias descritas. A pureza foi superior a 95% como verificado por eletroforese em tampão acídico, determinação quantitativa de ácido urônico, e alta atuação em análises cromatográficas líquidas. .....( Esta parte não será traduzida por mim, por enquanto.)

RESULTADOS

A Tat recombinante do HIV-1 e a forma de Tat-1 com somente o primeiro éxon de TAt, a qual carece da seqüência de aminoácidos codificada pelo segundo éxon do gene de Tat, foram expressadas em E.coli como proteínas GST-Tat fundidas. Proteínas GST quiméricas foram então purificadas a partir de extratos celulares por cromatografia de afinidade de glutationa-agarose (glutationa é GSH, um tripeptídeo da glicina e ST é glutationa S-Transferase, uma enzima que catalisa a reação da glutationa com uma molécula aceptora.) As proteínas Tat foram clivadas da metade GST da quimera por digestão co trombina e comparadas com proteínas GST-Tat intactas para a capacidade de trans-ativar o LTR do HIV-1. As proteínas recomiantes foram adicionadas em meio de cultura de células HL3T1 que contém cópias integradas de pL3CAT naqual o gene bacterial CAT é orientado/dirigido pelo LTR do HIV-1. Após a incubação, o nível de trans-ativação do LTR do HIV-1 por Tat foi determinado pela medição da concentração de CAT por ELISA de extratos celulares. Como mostrado na figura 1B, as formas de um éxon e de dois éxons de Tat exercem a mesma atividade trans-ativadora ambos como proteínas fundidas GST-Tat e proteínas Tat clivadas por trombina. Esses dados indicam que a metade GST não interfere com a capacidade de Tat extracelular de ser submetida/capturada pelas células HL3T1 e de exercer sua atividade trans-ativadora após a internalização.Esses dados também confirmam achados prévios indicando que a seqüência de aminoácidos do segundo éxon de Tat é dispensável para a atividade trans-ativadora da proteína Tat.

A heparina tem sido previamente noticiada por inibir a atividade trans-ativadora de Tat extracelular. Para validar ainda mais o uso das proteínas fundidas GST-Tat para estudos de interações entre Tat e heparinas, nós testamos a capacidade da heparina convencional para inibir a atividade trans-ativadora de ambos os tipos selvagens de Tat e Tat-1e quando fundidas à metade GST. Como mostrado na figura 1C, a heparina inibe a atividade trans-ativadora do LTR do HIV-1 de ambas as proteínas de Tat fundidas a GST com potência similar (ID igual a 1-5 nm). Resultados similares foram obtidos quando a proteínas Tat foram avaliadas após a clivagem da metade GST pela trombina (dados não mostrados). De novo, os dados indicaram que a metade GST não interfere com as interações Tat-heparina e sugerem que a seqüência de aminoácidos codificada pelo segundo éxon de Tat não está envolvida com essa interação. Baseado nisto, uma proteína de fita total das proteínas GST e Tat fundidas, não clivadas, foi utilizada em experimentos subseqüentes.

A INTERAÇÃO DE DIFERENTES GLICOSAMINOGLICANOS COM A PROTEÍNA GST-Tat
(Obs.: ID deve ser a abreviação de ‘dose infectante’.)

A indicação de que a metade GST não afeta a capacidade de Tat interagir com a heparina nos prontificou a estabelecer um protocolo experimental no qual nós tivemos a vantagem da habilidade de GST de ligar-se a gotas de glutationa-agarose, permitindo a imobilização de GST-Tat numa matriz sólida. A capacidade da GST-Tat imobilizada de interagir com a heparina foi então investigada. A heparina convencional liga-se à coluna de GST‑Tat‑glutationa‑agarose e pode ser eluída (separada por lavagem) com lavado de 3,0M NaCl. A especificidade dessa interação foi demonstrada pela inabilidade da heparina interagir com colunas de glutationa-agarose nos quais nenhuma proteína ou alguma proteína GST recombinante desprovida da metade Tat estivesse ligada às gotas de resina. A determinação da quantidade máxima de heparina retida pela resina GST-Tat, avaliada por detecção de GAG no fluxo através das colunas de GST-Tat carregados com quantidade de heparina em aumento indicou que 1ml de gotas de GST‑Tat‑glutationa‑agarose, correspondendo a 400μg de proteínas Tat, ligou 650µg de heparina convencional.

Então nós examinamos a capacidade da heparina convencional não marcada de competir com heparina marcada com H (heparan?) na ligação a Tat imobilizada com GST. Uma série de colunas de 80μl de GST‑Tat‑glutationa‑agarose foi carregada com amostras de 300µl contendo 50μg de heparina marcada com H (20.cpm) e concentração de heparina não marcada em aumento. As colunas foram lavadas extensivamente e a radioatividade nos eluatos (solução que emerge de uma coluna ou papel cromatográfico) de 3,0M NaCl foi medida. Como mostrado na figura 2B, as heparinas não marcadas competem pela ligação com as heparinas marcadas com H de modo dependente da dose, com uma ID50 igual a 10µM. A especificidade da competição é demonstrada pela falta de competição por um glicosaminoglicano não sulfatizado, o polissacarídeo capsular K5 de E.coli.

A capacidade de diferentes glicosaminoglicanos de competir com heparina marcada com H pela ligação a GST-Tat imobilizada foi então avaliada no mesmo ensaio. Como demonstrado na figura 3A, somente as heparinas, e numa extensão menor o HS (heparan sulfato) foram hábeis em competir pela ligação a Tat, enquanto concentrações equimolares de sulfato de dermatan, sulfatos de condroitina A e C, ácido hialurônico e o polissacarídeo K5 foram ineficientes. De acordo, 0,5µg/ml de heparina ou heparan sulfato, mas não outros glicosaminoglicanos testados, foram capazes de inibir significativamente a atividade trans-ativadora do LTR exercida pela fusão das proteínas GST-Tat nas células HL3T1.

Esses dados sugerem que a capacidade de GAG (glicosaminoglicano) interagir com a proteína Tat está relacionada, ao menos em parte, a diferenças em suas estruturas e intensidade/graduação de sulfatização. De fato, a heparina, a qual apresenta o maior número de grupos sulfato por unidade de dissacarídeo (SO3-/COO- = 2,14) é mais efetiva do que o HS (sulfato de heparan), enquanto nenhuma interação significativa foi observada com os ácidos hialurônicos não sulfatizados e com o polissacarídeo K5. Por outro lado, o sulfato de heparan é muito mais efetivo do que o sulfato de dermatan e os sulfatos de condroitina, ainda que eles todos apresentam uma valor SO3-/COO- similar de aproximadamente 1,0. Nos sulfatos de heparan, os grupos sulfato estão arranjados em conjuntos em carga de alta intensidade intervalados com regiões de carga de baixa densidade. Assim, o conhecimento da estrutura dos polissacarídeos e/ou a distribuição dos grupos sulfato ao longo da cadeia podem atuar num papel na mediação de suas interações com a proteína Tat.

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