quarta-feira, 9 de julho de 2008

OSTEONECROSES

Roberto Ezequiel Heymann e Daniel Feldman

Introdução

As osteonecroses não são entidades clínicas definidas, mas, resultantes de diversas condições que em maior ou menor grau determinam insuficiência do suprimento sangüíneo, com morte celular em todos os compartimentos do osso (hematopoiético, medula gordurosa e tecido mineralizado). Por esse motivo, também são chamadas de necrose óssea avascular ou necrose óssea asséptica.
A incidência da osteonecrose (ON) não está bem estabelecida. Nos EUA, estima-se em 15 mil novos casos por ano. Um estudo japonês em 1988, mostrou que ocorreram entre 2.500 e 3 mil casos de ON não-traumática da cabeça femoral: 34,7% eram devidos ao uso de corticosteróides (CEs); 21,8%, ao abuso do álcool; e37,1%, idiopáticas. Os homens são mais acometidos que as mulheres (8:1), não havedo dados sobre raça ou cor. A maioria dos casos ocorre antes dos 50 anos.

Fisiopatogenia

A diminuição ou interrupção mecânica do fluxo sangüíneo ao osso acometido é o mecanismo comum envolvido na maioria das condições associadas à ON. Duas ou três horas após a instalação da isquemia (sustação do fluxo sangüíneo), ocorre a morte de osteócitos e a necrose de adipócitos e da medula óssea hematopoiética ocorrem mais rapidamente do que o normal. No entanto, os sinais histológicos de necrose óssea somente se tornam evidentes após 24 a 72 horas. Em poucas situações pode ocorrer osteonecrose, não por diminuição de fluxo arterial, mas sim pela citotoxidade sobre os osteócitos.
Os mecanismos que podem levar a osteonecrose são:

1) Traumas:

Nos casos de trauma, a lesão é evidente, pois ocorre ruptura arterial, prejudicando o suprimento sangüíneo local. A prevalência de ON de cabeça femoral é de 10 a 25% após a luxação traumática do quadril, e entre 15 a 50% após fraturas. A duração da correção da luxação também é importante, visto que a ON associada tem prevalência dobrada se esta for corrigida 12 ou mais horas após a ocorrência.

2)Oclusão vascular

Alterações primárias das arteríolas, vênulas e dos capilares podem tornar as ONs equivalentes à doença coronariana no osso. Estudos histopatológicos dos vasos de ossos dom ON demonstram trombose, presença de gotículas de gordura e aumento de espessura das paredes, quando comparados a ossos com osteoartrose. Como observado em pacientes coronariopatas, os pacientes com ON compartilham fatores de risco semelhantes, como o uso de corticosteróides (CEs), diabetes melitus, vasculopatias, alcoolismo, hiperlipidemia e hiperviscosidade. Na síndrome do mergulhador e na anemia falciforme a ON é imputada à obstrução dos sinusóides por bolhas de nitrogênio ou por hemácias falcizadas. Estados de hiper-coagulação, como a trombofilia hereditária e deficiências de fibrinólise podem levar à diminuição do fluxo sangüíneo por trombose desses vasos.

Nas doenças difusas do tecido conjuntivo, principalmente no lúpus eritematoso sistêmico, as condições vasculares aqui descritas estão presentes com muita freqüência, justificando o elevado número de pacientes com ON (10%). De maneira surpreendente, estudos recentes não têm conseguido demonstrar correlação entre a presença de anticorpos antifosfolípides (definitivamente pró-trombóticos) e osteonecrose.

O uso de CE e o etilismo parecem aumentar o risco de desenvolver ON, por meio da embolia gordurosa. A assciação de CE e ON são cirunstanciais e baseadas em associações entre ON e a terapia com CE em inúmeras doenças reumatológicas e respiratórias, em pacientes que se submenteram a transplante de órgãos e em pacientes com síndrome de Cushing. A média da dose cumulativa de CE é de 4,32 mg e doses superiores a 20mg apresentam maior risco, principalmente em pacientes transplantados renais. Embolia gordurosa pulmonar e renal já tem sido demonstrada como decorrente de esteatose hepática, e alguns autores têm sido capazes de provocar ON experimental após injeção intra-arterial de lipidol. Etretanto, a origem das gotículas gordurosas encontradas nos vasos dos ossos com ON não está definida. Além do fígado, a desestabilização e a coalescência de lipoproteínas e o rompimento da medula óssea gordurosa podem sem fontes das mesmas.

3)Hipertensão intramedular

O CE também tem sido implicado em aumentar o tamanho dos adipócitos, aumentando o volume da medula gordurosa e da pressão intramedular, diminuindo o fluxo sangüíeo. Na doença de Gaucher ocorre acúmulo de glucocerebrosídeos, aumentando a pressão intramedular e favorecendo a ON.

4)Citotoxidade direta sobre os osteócitos

A radioterapia e a quimioterapia são causas menos freqüentes de ON. O CE também acelera a apoptose dos osteócitos, diminui a atividade osteoblástica e aumenta o catabolismo da matriz óssea.

5)Idiopática

Em algumas situações não há nenhuma etiologia de base que possa explicar o aparecimento de ON, sendo consideradas idiopáticas.

DIAGNÓSTICOS

O pronto diagnóstico da ON permite um tratamento mais precoce, favorecendo um resultado final melhor. O acometimento de mais de uma articulação é muito freqüente. Esse fato deve alertar o médico a investigar outras articulações quando o diagnóstico de ON for estabelecido.

Alterações radiográficas

Nos estágios iniciais da doença as radiologias simples são normais, mas outros métodos podem ser utilizados para o diagnóstico precoce. As alterações radiológicas mais precoces incluem osteopenia, área central radioluscente com borda esclerótica e esclerose linear. Nenhuma desses é específica de osteonecrose. Posteriormente, aparece linha radioluscente subcondral (sinal do crescente, ou da casca do ovo), denotando fratura subcondral. A alteração é praticamente patognomônica de osteonecrose, assim como as alterações posteriores, como o achatamento da epífise e o colapso total com manutenção do espaço articular. Em fases mais tardias, ocorre processo de osteoartrite secundária, com diminuição do espaço articular e formação de osteófitos.

Diagnósticos diferenciais

Nos estágios III (sinal do crescente) e IV(achatamento ou colapso) as radiografias são características, não havendo qualquer dificuldade para o diagnóstico. Quando os primeiros exames radiológicos mostram estágios V (achatamento ou colapso somado a diminuição do espaço intra articular) e VI (destruição total), é impossível fazer o diagnóstico diferencial com outras causas de destruição articular. Entretanto, nessas fases, a dúvida perde interesse prático, pois a conduta será sempre a mesma, ou seja, há indicação de prótese articular.

O diagnóstico diferencial mais difícil ocorre nos estágios I (alteração isolada da ressonância magnética nuclear que delimita o tecido necrótico do normal e uma linha representando o tecido de granulação hipervascular, em casos avançados pós-colapso deixa de ter utilidade) e II (radiografia, cintilografia óssea, RMN e Tomografia computadorizada alterados sem colapso). No primeiro, todas as afecções inflamatórias articulares devem ser consideradas, e a realização da ressonância magnética é obrigatória. A entidade mais difícil de ser afastada é a algoneurodistrofia transitória (especialmente do quadril), que requer dados da história e dos antecedentes do indivíduo para ser diferenciada.

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