domingo, 9 de agosto de 2009

Desafios no Desenvolvimento de uma Vacina para o HIV-1

Dan H. Barouch
2 October 2008

RESUMO

O desevolvimento de uma vacina segura e efetiva para o HIV-1 é uma prioridade criticamente importante para a saúde global. A despeito dos avanços recentes em nosso entendimento da patogênese e imunidade do HIV-1, entretanto, os principais obstáculos científicos permanecem. O modelo de vacinas anti-HIV-1 candidatas visando a elicitação das respostas humoral e imune falharam até agora em proteger contra a infecção por HIV-1 ou reduzir a carga viral após a infecção em estudos de eficácia clínica. Um compromisso renovado e coordenado com as pesquisas de descobrimento básico, estudos pré-clínicos e testes clínicos serão, por isso, necessários para suplantar as barreiras faceando correntemente este campo. Aqui, eu revisei os desafios chave e prospecções futuras na questão do desenvolvimento de uma vacina profilática para o HIV-1.

INTRODUÇÃO

Já faz 25 anos desde que o HIV-1 foi identificado como o agente causador da AIDS. Mais de sessenta milhões de pessoas em todo o mundo foram infectadas com o HIV-1, a maioria no mundo em desenvolvimento, e perto da metade desses indivíduos faleceram. O desenvolvimento de uma vacina segura e efetiva seria indubitavelmente a melhor solução para o controle final da pandemia de AIDS no mundo inteiro, porém, desafortunadamente, os esforços para o desenvolvimento de uma vacina para o HIV-1 ainda não se provaram prósperos. A extraordinária diversidade do HIV-1, a capacidade do vírus de evadir-se às respostas imunes adaptativas, a incapacidade de induzir completamente/amplamente a resposta de anticorpos reativos, o precoce estabelecimento de reservatórios virais latentes, e a falta de correlatos imunes claros de proteção representam desafios não precedentes para o desenvolvimento de uma vacina.

O objetivo de uma vacina para o HIV-1 seria tanto prevenir a infecção ou reduzir a carga viral e a progressão clínica da doença após a infecção. Uma vacina ideal bloquearia completamente a infecção e proporcionaria a imunidade esterilizante. Embora tal vacina fosse ótima, essa grau de proteção não foi alcançado ainda com as a maioria das vacinas clinicamente licenciadas. Em contraste, a maioria das vacinas virais licenciadas parecem funcionar por controle da replicação viral sub-clínica e por prevenir contra a doença clínica. Pode ser por isso mais sensato desenvolver-se uma vacina sub-ótima para o HIV-1 do que falhar em prevenir a infecção mas proporcionar um controle imune parcial da replicação viral após a infecção. Este controle parcial, como exemplificado por uma redução no pico e no ponto de estabelecimento da carga viral após a infecção, tem sido demonstrado em certos estudos pré-clínicos por vacinas que elicitam as respostas dos linfócitos T. Além disso, porque a carga viral representa um determinante principal da transmissão do HIV-1, é concebível que uma vacina parcialmente protetora deva ter um impacto substancial no nível de população.

A despeito da necessidade urgente de uma vacina para o HIV-1, somente dois conceitos vacinais completaram os estudos clínicos de sua eficácia, até o momento. O primeiro conceito de vacina usou a proteína gp120 monomérica da ENV (gp120 + gp41) do HIV-1 , e o objetivo dessa estratégia foi induzir respostas imunes humorais específicas para ENV. Na fase inicial dos testes clínicos, os imunógenos de gp120 elicitaram anticorpos de ligação específica ao tipo, mas falharam em induzir anticorpos neutralizantes amplamente reativos. Em dois testes de eficácia de fase 3 pela companhia de biotecnologia VaxGen, essas vacinas candidatas não forneceram eficácia protetora detectável, indicando que essas respostas de anticorpos específicas para o tipo eram insuficientes para proteger contra a infecção por HIV-1 em humanos. Outro estudo de fase 3 avaliando a eficácia de um regime vacinal de estímulo com vetor de canaripox recombinante com a proteína gp120 está correntemente a caminho. O segundo conceito de vacina que completou os estudos de eficácia clínica envolveu vetores recombinantes do adenovírus de sorotipo 5 (rAd5) incompetentes para replicação expressando Gag, Pol e Nef do HIV-1. O objetivo dessa estratégia era elicitar as respostas imunes celulares específicas para o HIV-1. Os testes clínicos de fases iniciais demonstraram que vacinas baseadas no vetor rAd5 elicitaram as respostas imunes celulares na maioria dos sujeitados, embora essas respostas fossem parcialmente suprimidas em indivíduos com anticorpos neutralizantes específicos para o Ad5 pré-existentes. Os testes de eficácia de fase 2b subvencionados pela Merck e pelos Instituto Nacional de Saúde (NIH) foram finalizados desafortunadamente quando as primeiras análises interinas planejadas mostraram que essa vacina falhava em proteger contra a infecção ou em reduzir a carga viral após a infecção, e que os vacinados que tinham previamente anticorpos neutralizantes específicos para Adr5 exibiram uma taxa aumentada de aquisição de HIV-1. Esses resultados têm ilustrado novos desafios e tem levado ao debate substancial com relação ao caminho optimal a seguir no campo da vacina contra o HIV-1.

DESAFIOS VIROLÓGICOS E IMUNOLÓGICOS

Os desafios para o desenvolvimento de uma vacina profilática contra o HIV-1 não têm precedentes. A extraordinária diversidade do HIV-1 no mundo representa talvez a maior barreira. Guiados pela propensão ao erro da transcriptase reversa, o grupo M do HIV-1 tem-se diversificado em nove clados divergentes , bem como em múltiplas formas recombinantes em circulação. As sequencias de aminoácidos de Env podem divergir em mais de 20% dentro de uma classe particular e mais de 35% entre classes diferentes. Um imunógeno vacinal precisará, por isso, combater extraordinariamente um alto grau de diversidade viral, e a proteção vacinal será necessariamente dependente da capacidade das respostas imunes em reagir em cruzamento com viroses altamente heterogêneas. Embora as respostas imunes humoral e celular de reação cruzada contra regiões conservadas do vírus tenham sido relatadas, é razoável assumir que a eficácia protetora diminuirá substancialmente com o aumento da divergência entre antígenos vacinais e viroses infectantes.

Outro desafio chave é a falta de correlatos de eliminação imune de proteção em humanos, pois os pacientes infectados por HIV-1 são incapazes de erradicar o vírus. Uma evidência sugestiva com relação a correlatos imunes de proteção deverão ser obtidos a partir dos estudos de desafio viral em primatas não-humanos e a partir de estudos de indivíduos infectados com HIV-1 que controlam a replicação viral em níveis muito baixos espontaneamente. Entretant, um correlato imune definitivo de proteção emergirá provavelmente somente no contexto de estudos exitosos de eficácia vacinal em humanos.


A Resposta Humoral Específica para o HIV-1

Títulos (padrão de concentração)de anticorpos neutralizantes específicos para o vírus representam um correlato imune chave de proteção para a maioria das vacinas virais licenciadas, e assim s primeiros estudos focalizaram o desenvolvimento de sub-unidades imunogênicas da Env do HIV-1. Os avanços em nosso entendimento sobre a estrutura e função da Env começaram a elucidar o por quê da geração de anticorpos amplamente neutralizantes reativos ao HIV-1 por vacinação pode ser tão difícil. A glicoproteína Env do HIV-1 é um trímero na superfície do vírion com extensiva glicosilação ligada na ponta N que age efetivamente como um escudo para muitos epítopos conservados contra o reconhecimento pelos anticorpos. Alças altamente imunogênicas variáveis também elicitam anticorpos específicos para cada tipo que podem redirecionar as respostas humorais para fora das regiões conservadas. Em adição, regiões chave conservadas, tas como o sítio de ligação do co-receptor de quimiocina, são formados somente após a ligação da Env ao receptor celular CD4 e submetem-se a uma extensa mudança em sua conformação. O desenvolvimento de mutações nos glicanos ligados ao N (amina terminal) também têm sido mostradas por levar à rápida evasão das respostas de anticorpos neutralizantes do hospedeiro.

Todavia, a atividade de anticorpos neutralizantes amplamente reativa têm sido identificada em um pequeno número de sujeitos infectados com o HIV-1, e essa reatividade parece estar largamente direcionada contra regiões conservadas da glicoproteína Env tais como o sítio de ligação a CD4. O anticorpo monoclonal amplamente reativo b12 também se liga ao sítio de ligação à CD4, sugerindo que essa região da glicoproteína Env pode representar um ponto crítico de vulnerabilidade que é potencialmente acessível à neutralização. Entretanto, o sítio de ligação à CD4 é recuado e só parcialmente acessível à ligação pelo anticorpo. Outra região conservada é a região externa próxima à membrana da gp41 (MPER), a qual representa o alvo dos anticorpos monoclonais amplamente reativos 2F5 e 4E10. Entretanto, anticorpos neutralizantes específicos para MPER podem ser dificilmente elicicitados por vacinação por múltiplas razões, incluindo o controle de tolerância e imuno-regulação, seqüestro do epítopo na membrana lipídica, exposição do epítopo só transitoriamente durante a entrada do vírus, ou possivelmente uma combinação de múltiplos fatores.

O desenvolvimento de imonógenos que induzem anticorpos neutralizantes amplamente reativos é talvez a mais importante prioridade para o campo da vacina para o HIV-1. Estudos de prova do conceito de transferência passiva em primatas não humanos têm mostrado que a administração de altas doses de anticorpos monoclonais altamente reativos pode fornecer proteção esterilizante da infecção, demonstrando assim o potencial da imunidade humoral específica para o vírus. Entretanto, não foi possível induzir estes anticorpos neutralizantes amplamente reativos por vacinação, até o momento. Embora tenha havido um progresso substancial em nosso entendimento sobre a estrutura e função de Env, não existem correntemente vacinas candidatas que estejam visando a elicitar anticorpos neutralizantes amplamente reativos especificamente para Env nos testes clínicos. É plausível que a próxima geração de imunógenos para Env sejam antígenos que precisam ser engenheirados. Estratégias que estão sendo perseguidas incluem a geração de trímeros bioquimicamente estabilizados de Env, restringindo os imunógenos de Env em conformações estruturalmente definidas, fornecendo epítopos de neutralização conservada em proteínas que não são produzidas pelo organismo do hospedeiro, desenvolvendo métodos para envolver a imunorregulação, e desenhando imunógenos para regiões alvo específicas como o sítio de ligação a CD4, a região MPER e elementos estruturalmente conservados do laço V3. A relevância de anticorpos não neutralizantes que mediam outras funções efetoras tais como inibição viral mediada pela célula e dependente de anticorpos, ativação do complemento e fagocitose também está sendo investigada.


Imunidade Celular Específica para o HIV-1

Acredita-se que as respostas do linfócito T específicas para o vírus tenham um papel crítico no controle da replicação do HIV-1 e estão sendo, por isso, ativamente exploradas no desenvolvimento de estratégias vacinais. Os primeiros estudos mostraram que as respostas específicas para o vírus do linfócito T CD8+ emergem durante a infecção aguda coincidentemente com o controle primário da viremia. Respostas imunes celulares potentes também tem sido relatadas em não progressores de longo prazo, e alelos específicos de HLA e a liberação das respostas do linfócito T específicas para Gag tem estado correlacionadas com o controle da replicação viral em indivíduos infectados por HIV-1. De acordo com essas observações, a depleção experimental dos linfócitos CD8+ tem mostrado abolir o controle imune da replicação do vírus da imunodeficiência símia (SIV) em macacos Rhesus.

Uma limitação de respostas de linfócitos T específicos para o vírus é a propensão do vírus acumular mutações nos epítopos para o linfócito T e evadir ao controle imune celular. Por isso é plausível que as respostas do linfócito T específicas ao epítopo de tolerância provar-se-ão críticas para uma vacina para o HIV-1, não somente para maximizar a cobertura imunológica da diversidade do HIV-1, mas também para minimizar o potencial de escape viral do reconhecimento pelos linfócitos T. Entretanto, a amplitude das respostas imunes celulares elicitadas pela vacina pode ser limitada pela restrição imunodominante e pela tendência herdade das respostas do linfócito T CD8+ em ser altamente focado para um número limitado de epítopos.

Avanços recentes na caracterização das respostas do linfócito T por citometria de fluxo de múltiplos parâmetros têm iluminado a diversidade funcional dos linfócitos T específicos para o vírus, em termos de secreção de citocinas, degranulação, proliferação e outras funções efetoras em várias sub-populações de linfócitos T efetores e de memória. É plausível que a funcionalidade complexa dos linfócitos T possa, em última instância, provar-se mais relevante do que a secreção do interferom gama como mensurado por ensaios de imuno-manchas (ELISPOT) ligados a enzimas para a contabilização das respostas imunes celulares elicitadas por vacina. Linfócitos T poli-funcionais capazes de desempenhar múltiplas funções têm sido relatados em não progressores de longo prazo, em recebedores de vacinas efetivas como da vacínia, e em certos estudos de desafio pré-clínico. Essas considerações sugerem que a amplitude e a qualidade das respostas do linfócito T pode provar-se crítica em adição à magnitude dessas respostas.

Talvez a mais significativa limitação das respostas imunes celulares elicitadas por vacina seja que elas provavelmente não protegem contra a aquisição da infecção por HIV-1. Como resultado, as respostas do linfócito T induzidas por vacina presumivelmente serão incapazes de prevenir a infecção por toda a vida, pois o vírus rapidamente estabelece reservatórios latentes. Além disso, não está claro se os linfócitos T elicitados por vacina estarão aptos a funcionar rápido o suficiente dada a importância de que importantes eventos imunopatológicos ocorrem dentro de poucos dias na infecção aguda por HIV-1. O HIV-1 infecta preferencialmente linfócitos T CD4+ específicos do HIV-1 e rapidamente depleta a maioria dos linfócitos TCD4+ de memória no tecido linfóide associado ao intestino dentro dos primeiros 4 a 10 dias de infecção. Isso estabelece o estágio de imunodeficiência progressiva bem como a ativação imune crônica, o que provavelmente resulta enfim em parte da transmigração microbiana através da mucosa intestinal danificada. Dado o tempo requerido para as respostas dos linfócitos T CD8+ induzidos por vacinação expandirem-se após a infecção, pode ser difícil para os linfócitos T elicitados por vacinação impedirem esses primeiros eventos imunopatológicos completamente.


AS ATUAIS ESTRATÉGIAS VACINAIS PARA O HIV-1.

Estratégias Tradicionais

As estratégias vacinais para o HIV-1 podem ser divididas em tradicionais e novas abordagens vacinais. As tecnologias da vacina tradicional incluem viroses atenuadas vivas, viroses totalmente mortas e sub-unidades protéicas. Embora essas abordagens tenham-se provado de enorme sucesso para o desenvolvimento de vacinas contra outras viroses, todas elas têm limitações substanciais em termos de sua utilidade para o HIV-1. Viroses atenuadas vivas têm proporcionado eficácia protetora considerável contra o SIV em macacos rhesus desafiados, mas elas são impróprias para o uso em humanos no que concerne à segurança. Em contraste, viroses completamente mortas e sub-unidades de proteínas são limitadas por sua incapacidade para elicitar respostas de anticorpos neutralizantes amplamente reativos bem como por sua incapacidade de elicitar as respostas do linfócito TCD8+. Dados recentes, entretanto, sugerem que os receptores Toll-like como adjuvantes podem aumentar a utilidade dos imunógenos de sub-unidades protéicas.

Novas Estratégias

Novas estratégias vacinais incluem tecnologias de entrega de genes tais como vacinas de plasmídio de DNA e vetores recombinantes vivos que são engenheirados para expressar antígenos do HIV-1. Vacinas de plasmídio de DNA frequentemente oferecem promessas consideráveis em termos de simplicidade e versatilidade, porém múltiplas injeções de altas doses de vacinas de DNA são requeridas para elicitar respostas imunes tipicamente detectáveis em primatas humanos e não humanos. Uma pesquisa substancial está, por isso, focada no desenvolvimento de adjuvantes para vacinas de DNA e em tecnologias melhoradas de entrega do DNA tais como eletroporação [técnica pela qual se aplica um breve choque elétrico às células fazendo com que orifícios momentâneos se abram para a entrada de macromoléculas; p.ex. uma forma de introduzir DNA novo em uma célula. Stedman]. Vetores recombinantes incluem viroses atenuadas ou incompetentes para a replicação, mais notadamente adenoviroses e poxviroses [viroses que promovem pequenas feridas na pele]. Vetores virais, administrados tanto sozinhos ou no contexto de regimes de estímulo de DNA de origem e vetor heterólogos representam as principais vacinas para o HIV-1 candidatas que estão em testes clínicos atualmente. Outros vetores virais que estão sendo avaliados incluem o vírus da estomatite vesicular, vírus associados à glândulas, vírus da encefalite eqüina venezuelana, citomegalovírus, vírus do herpes simples e vírus measles. Vetores bacterianos e micobacterianos (fungos?) também estão sendo explorados, incluindo a Salmonella, Listéria e o Bacilo de Calmette-Guérin (BCG).


O Estudo de Etapas

Conhecimento Pré-clínico

Vetores recombinantes de Ad5 foram selecionados para o desenvolvimento pela Merck com base em estudos pré-clínicos de comparação de vetor que mostraram que vetores rAd5 (r de recombinante) eram mais imunogênicos que outras múltiplas modalidades de vetores em macacos rhesus. Além disso, vetores Ad5 expressando a Gag do SIV concederam marcadas reduções nas cargas virais após o desafio de macacos reshus com o vírus da imunodeficiência humana/símia quimérico (SHIV)- 89.6P. Entretanto, também foi observado que a mesma vacina concedeu de mínimo a nenhum controle de pico ou do ponto de estabelecimento da carga viral após o desafio com SIVMAC239 , indicando que os desafios com SIV foram consideravelmente mais rigorosos do que os desafios com SHIV-89.6P.

O regime de estímulo com molde de DNA/Ad5 expressando a Gag SIV forneceu uma redução breve (90 dias) e marginal (0,8 log) do pico da carga viral após o desafio com SIVMAC239 , mas esse efeito só foi observado em macacos rhesus que foram selecionados para expressar a molécula Mamu-A*01 do complexo maior de histocompatibilidade (MHC) de classe I, a qual está associada com o controle virológico eficiente. O regime de molde de DNA/rAd5 expressando múltiplos antígenos de SIV forneceram eficácia protetora aumentada nos macacos Mamu-A*01 positivos, indicando que expandir a amplitude das respostas imunes celulares melhora a proteção. Entretanto, nem o regime de rAd5 sozinho ou de estímulo com molde de DNA/rAd5 foram capazes de reduzir o ponto estabelecido da carga viral após o desafio de SIV em macacos rhesus negativos em Mamu-A*01, até o momento.



Estudos Clínicos

A vacina candidata da Merck foi formulada como uma mistura trivalente de vetores de rAd5 expressando as proteínas Gag, Pol e Nef do HIV-1 de classe B. Os testes clínicos de fase 1 sugeriram que essa vacina foi, em geral, bem tolerada e imungênica na maioria dos voluntários. Entretanto, como previsto por estudos pré-clínicos, as respostas a esta vacina foram parcialmente suprimidas em indivíduos com anticorpos neutralizantes pré-existentes contra o vetor da vacina. Devido a 30 a 40% da população dos Estados Unidos e da Europa Ocidental e 80 a 90% das pessoas na África sub-Sahariana terem anticorpos neutralizantes específicos para o Ad5 pré-existentes, o impacto da imunidade contra o vetor foi previsto como uma limitação dos vetores rAd5.

Duas fases 2b de estudos de eficácia de “prova de conceito” foram iniciadas pela Merck e o Instituto Nacional de Saúde para determinar se as respostas imunes celulares específicas para o HIV-1 induzidas por esse regime vacinal preveniriam a infecção por HIV-1 ou reduziriam a carga viral após a infecção. A Rede de Trabalho de Testes da Vacina para o HIV-1 (HVTN) no 502, também conhecida como estudo de Etapa, foi um estudo com 3.000 pessoas nas Américas, Caribe e Austrália. A HVTN 503, também chamada “Phambili” (o que significa ‘mover para frente’ em Xhosa – língua Bantu no Sul da África), foi designada como um estudo paralelo de 3.000 pessoas na África do Sul.

Em 18 de setembro de 2007, a HVTN 502 foi inesperadamente terminada no ínterim do primeiro plano de análises quando o Conselho de Monitoramento de Dados e Segurança declarou a futilidade do estudo para atingir seus objetivos primários. Além disso, em pessoas com títulos de anticorpos neutralizantes específicos para o Ad5 pré-existentes, ocorreu um grande número de infecções por HIV-1 em vacinados mais que em recebedores de placebo. Embora as bases biológicas para essa observação permaneçam obscurecidas, esses dados sugerem que a vacinação com vetores rAd5 pode estar associada com um aumento no risco de aquisição do HI-1 neste sub-grupo. Análises posteriores multivariadas a partir desses dados, sugeriram suplementarmente que o risco mais acrescido estava em homens que tinham anticorpos neutralizantes específicos para o Ad5 pré-existentes e que eram circuncisados.

Não está claro, correntemente, se a falta de eficácia no estudo de Etapa simplesmente representa a falência da vacina de rAd5-Gag/Pol/Nef da Merck ou se isso deverá ser arbitrado à falência do conceito da vacina com a célula T em geral. É aceitável que dados substanciais venham emergir a partir de análises imunológicas detalhadas dos vacinados que subsequentemente tornaram-se infectados, e é possível que a vacina com rAd5-Gag/Pol/Nef tenha falhado em induzir suficiente magnitude, amplitude ou qualidade das resposta imunes celulares. No presente momento, por este motivo, pareceria prematuro considerar a falência desse estudo singular com a falência de vacinas baseadas em célula T em geral.

O risco aparentemente aumentado de aquisição do HIV-1 em vacinados que tinham anticorpos neutralizantes específicos para Ad5 pré-existentes foi inesperado, e esse achado ilumina nossa falta de entendimento dos parâmetros que determinam a suscetibilidade à infecção por HIV-1. As bases biológicas para essa observação permanecem sem esclarecimento. Uma hipótese é que a vacinação com rAd5 de indivíduos com anticorpos neutralizantes específicos para Ad5 pré-existentes poderia ter resultado em linfócitos T CD4+ de memória específicos para o Ad5 que eram alvos aumentados para a infecção por HIV-1. Entretanto, os primeiros dados sugeriram que as respostas específicas para Ad5 de linfócitos T após a vacinação com rAd5 são atualmente mais baixas em indivíduos que têm anticorpos neutralizantes específicos para o Ad5 pré-existentes do que aqueles sem os anticorpos pré-existentes neutralizantes específicos para o Ad5 (J. McElrath, observações não publicadas). Uma hipótese alternativa é que os anticorpos neutralizantes específicos para o Ad5 tenham opsonizado (se ligado a)os vetores de rAd5 após a imunização, resultando na alteração do tropismo ou das respostas inflamatórias. Também é possível que os anticorpos neutralizantes específicos para Ad5 pré-existentes tenham sido um marcador para outras variáveis misturadas que não tenham sido identificadas ainda.

Uma ETAPA adiante?

A despeito dos resultados desapontadores do estudo e ETAPA, várias lições chave tem sido aprendidas agora. Primeiro, está claro que o caminho na direção de uma vacina para o HIV-1 não será nem simples nem fácil. Segundo, a importância do entendimento de ambas as respostas imunes sistêmicas e da mucosa para vetores vacinais é primordial. Terceiro, os determinantes biológicos da aquisição do HIV-1 e o impacto que as respostas imunes da mucosa a antígenos específicos e a vetores específicos podem ter nesse processo hão de requerer investigação intensiva. Quarto, estudos vacinais clínicos serão necessários para adaptar ao que concerne à segurança relevada no estudo de ETAPA, tal como a possibilidade de exclusão de pessoas que tenham anticorpos neutralizantes pré-existentes para o vetor da vacina que estará sendo usado até este fenômeno ser compreendido mais completamente. Quinto, futuras vacinas candidatas baseadas em células T deverão ser priorizadas para estudos de eficácia clínica somente se forem convincentemente superiores ao regime homólogo de rAd5-Gag/Pol/Nef que falhou. Sexto, modelos de primatas não humanos devem ser recalibrados (avaliados com precisão) com base no estudo de ETAPA para guiar o desenvolvimento de uma futura vacina para o HIV-1.

A proteção proporcionada pelo regime homólogo de rAd5 contra SHIV-89.6P indica que este modelo carece de austeridade para a avaliação de vacinas candidatas baseadas em células T. Embora o modelo mais rigoroso de desafio com SIV não possa ser considerado com validamente útil existe um estudo de eficácia clínica de sucesso em humanos, parece razoável usar SIVMAC239 ou SIVMAC251 como viroses de desafio para avaliar vacinas candidatas de próxima geração. Estudos de desafio pré-clinico precisam ser adequadamente capacitados com tempo suficiente de acompanhamento, e o agendamento e dose da vacina deverá servir de modelo para o regime clínico proposto. Para um rigor otimizado, os estudos deverão excluir macacos rhesus que expressam alelos de MHC de classe I que estão especificamente associados com o controle virológico eficiente, tais como Mamu-A*01, Mamu-B*17 e Mamu-B*08. O uso de antígenos homólogos de Env que possam superestimar inapropriadamente a eficácia protetora também devem ser evitados. Os desafios na mucosa podem oferecer certas vantagens fisiológicas sobre os desafios intravenosos, e esses modelos de desafio deverão ser desenvolvidos. Finalmente, uma ênfase aumentada deve ser colocada na estimativa da capacidade das promissoras vacinas candidatas em proteger contra desafios com SIV altamente heterogêneos, pois as viroses infectantes em humanos serão certamente heterólogas à qualquer sequência da vacina. Devido a poucos estudos de desafio com SIV heterólogos terem sido completados até agora, uma abordagem prática pode ser a determinação da eficácia protetora de vacinas promitentes candidatas contra ambos os desafios com SIV homóloga e heteróloga. Atualmente há um debate sobre se os estudos de desafio em primatas não humanos poderiam ser usados como um ‘guarda’ formal para vacinas candidatas avançadas em estudos de eficácia clínica, pois a capacidade desse modelo para prever os resultados dos estudos de eficácia clínica permanecem obscurecidos. Todavia, pareceria razoável dar uma prioridade relativa ao desenvolvimento de vacinas candidatas que levaram a um controle duradouro da carga viral estabelecida após o desafio com SIVMAC239 ou com SIVMAC251.

O estudo de ETAPA também teve um impacto principal em outros programas de vacina para o HV-1 em campo. O HVTN 503 terminou porque usava a mesma vacina candidata baseada em rAd5 que foi usada no HVTN 502. O Centro de Pesquisa de Vacinas NIH desenvolveu um regime vacinal estimulador com molde/rAd5 expressando antígenos da Gag e da Pol de classe B e a Env de múltiplas classes de HIV. Essa vacina candidate tem sido mostrada como imunogênica na maioria dos indivíduos nos estudos de fase 1, particularmente para os antígenos de Env. Em estudos pré-clínicos, um regime de estímulo vacinal com molde/rAd5 expressando os antígenos de Gag, Pol, Nef e Env do SIV forneceram uma redução de 1,1 log no pico da carga viral por 112 dias após o desafio com SIVMAC251 homólogo. Entretanto, nenhum controle duradouro do ponto de estabelecimento da carga viral foi observado com esta vacina, embora a procrastinação na progressão para a mortalidade relacionada com a AIDS fosse evidente. O NIH anunciou recentemente que não procederá no estudo de eficácia de fase 2b ampla conhecido como PAVE 100, embora um estudo de eficácia menor, mais focado na vacina candidata já esteja sob consideração. Regimes de estimulação com molde de DNA/poxvírus (vírus da grande família Poxviridae incluindo os gêneros Orthopoxvírus, Avipoxvírus, Capripoxvírus, Leporipoxvírus e Parapoxvírus - Stedman) também estão sendo avaliados usando-se vetores modificados de vacínia Ankara (MVA) e de NYVAC, e testes clínicos de fase 1 tem demonstrado imunogenicidade na maioria dos voluntários. Entretanto, é central para esses programas, a hipótese de que o molde de DNA, antes do estímulo do vetor, melhorará a eficácia da proteção. Isso tem sido observado em alguns, mas não todos os estudos de desafio com SIV, e assim isso ainda permanece uma questão em aberto que requer investigação adicional e será considerada de alta prioridade.

Novos vetores de rAd derivados de sorotipos de Ad que são raros na população humana também estão sendo explorados como uma estratégia para evadir aos anticorpos neutralizantes específicos para Ad5 pré-existentes. Espera-se que tais vetores possam oferecer vantagens imunológicas bem como segurança em comparação aos vetores de rAd5 nas circustâncias de anticorpos pré-existentes neutralizantes específicos para o vetor. Entretanto, essas possibilidades não foram confirmadas ainda em testes clínicos. Estratégias correntes incluem o desenvolvimento de vetores de raros sorotipos rAd26, rAd35 e rAd48 ; vetores quiméricos rAd5HVR48 nos quais os epítopos dominantes para os anticorpos neutralizantes específicos para Ad5 tenham sido trocados; e vetores de rAd não humano. Vetores de rAd de sorotipo raro são biologicamente diferentes dos vetores de rAd5 em termos de seus receptores celulares, tropismo, vias de tráfego intracelular e perfis imunes inatos. Além disso, os vetores rAd26 e rAd48 têm sido mostrados por elicitar respostas do linfócito T de um fenótipo substancialmente diverso em comparação com vetores rAd5, e potnetes regimes de estímulo com molde rAd heterólogos podem ser construídos usando-se vetores rAd sorologicamente distintos. Nós demonstramos recentemente que um regime de estimulação com molde rAD26/Ad5 heterólogos expressando a Gag do SIV forneceu uma duradoura redução de 2,4 log do ponto de estabelecimento da carga viral após o desafio com SIVMAC251 dos macacos rhesus negativos para o Mamu-A*01, enquanto um regime de rAd5 homólogo não proporcionou proteção nesse rigoroso modelo de desafio. Nossos dados sugerem que vacinas candidatas que elicitam melhorada magnitude, amplitude e qualidade de respostas de linfócito T podem proporcionar eficácia protetora superior em comparação com regimes de rAd5 homólogos.

PERSPECTIVAS E DIREÇÕES FUTURAS

Para uma grande dimensão, a ciência da vacina do HIV-1 ainda está na infância. Os principais problemas permanecem não resolvidos, e um renovado compromisso com a pesquisa de descobrimento básico em adição aos estudos pré-clínicos e testes clínicos serão requeridos para mover o campo adiante. Testes clínicos que estão focados em responder hipóteses científicas específicas mais do que exclusivamente voltados para o desenvolvimento do produto podem ser mais úteis ao campo no presente momento. Certos regimes vacinais, tais como regimes de estímulo com modelos de rAd heterólogos, podem oferecer a possibilidade de aumento da magnitude, amplitude e qualidade das respostas de linfócitos T em comparação com os regimes de rAd5 homólogo. Novos conceitos, tais como consenso centralizado e imunógenos em mosaico, também podem resultar em aumento na amplitude das respostas imunes celulares e melhoramento na cobertura da diversidade viral.

Talvez o foco mais importante da pesquise devesse ser o desenvolvimento de imunógenos melhorados de Env para elicitar anticorpos neutralizantes amplamente reativos. Dado o objetivo desse problema, pesquisas básicas incrementadas em direção à estrutura, função e imunogenicidade da glicoproteína Env serão requeridas. Idéias inovadoras e de alto risco serão perseguidas, e abordagens promissoras serão testadas o mais rapidamente possível em estudos pré-clínicos e eventualmente em testes clínicos. Enfim, é aceitável que uma vacina em combinação consistindo de componentes vacinais separados que elicitam linfócitos T e anticorpos neutralizantes provar-se-á ótima. Em resultado, o desenvolvimento de estratégias vacinais baseadas em anticorpos e baseadas em célula T deverá ser perseguido em paralelo.

Para atingir esses objetivos, será de sumária importância atrair e reter novos e talentosos investigadores para este campo. Os programas de fundos deverão ser, por isso, expandidos para encorajar investigadores juniores a explorar idéias inovadoras que relacionem problemas críticos neste campo Dados os desafios científicos que faceiam o campo do HIV-1 atualmente, um suporte e incentivo aumentados de capacitação de docentes e estudantes será visto no topo da prioridade por ambos os investigadores experientes e organizações de fomento. Também será importante para a indústria continuar a participar no campo da vacina para o HIV-1, já que as companhias de biotecnologia e farmacêuticas têm conhecimento e capacidade críticos que não estão disponibilizados nas academias, governo e organizações não-profissionais.

Há um debate atual sobre a possibilidade do campo da vacina para o HIV-1 resistir a outra falência no estudo de eficácia. Para o HIV-1, os desafios científicos são enormes, e assim então são os riscos nos testes de qualquer novo conceito vacinal. Claramente, a decisão para avançar uma vacina candidata em testes de eficácia deverá ser altamente seletiva e baseada em uma análise transparente e rigorosa dos dados clínicos e pré-clínicos. Entretanto, não há outro caminho para determinar se uma promissora vacina candidata oferecerá proteção em humanos senão pela condução de estudos de eficácia clínica. Testes de eficácia múltipla podem ser requeridos, e muitos conceitos falharão indubitavelmente. Nós devemos por isso estar preparados para aceitar múltiplas falhas nos estudos de eficácia como parte do caminho ao longo do esperado desenvolvimento terminado com o sucesso de uma vacina segura e efetiva contra o HIV-1.

Fonte - http://www.nature.com/nature/journal/v455/n7213/full/nature07352.html

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